FalaPET Nº16— O subdesenvolvimento chinês pela ótica da teoria dos arranjos produtivos
- Introdução
O subdesenvolvimento chinês é um assunto que abrange os interesses, não só das ciências econômicas, mas da população chinesa como um todo, visto que mesmo sendo uma das principais potências mundiais, a República Popular da China (RPC) ainda continua sendo um país subdesenvolvido, fato que interfere na qualidade de vida de algumas camadas da população.
O impacto disso é sofrido pelo proletariado chinês, principalmente aquele que se encontra no interior do país, além disso, também é absorvido pela economia mundial, visto a importância do país para com o comércio internacional. Com isso, é feito uma análise na qual é analisado que o subdesenvolvimento chinês pode ter, como um dos seus frutos, a concentração industrial em determinadas regiões, formando arranjos produtivos.
2. A teoria dos arranjos produtivos
Arranjos produtivos são regiões de concentração de empresas (públicas ou privadas), consequência das vantagens que as regiões proporcionam para as empresas através dos ganhos em suas produtividades. Esses ganhos, formadores das concentrações, se verificam ao redor delas, gerando o processo denominado de Externalidade. Os ganhos vindos das Externalidades resultam em uma diminuição de custo e em um aumento de lucro, além dos arranjos produtivos permitirem a interação positiva entre firmas, fator essencial para a competitividade (ROSENDO, 2004). Além disso, outras vantagens das Externalidades são: a presença de fornecedores especializados, mercado de trabalho comum e a possibilidade de retornos crescentes em nível nacional e internacional.
Conforme a evolução do sistema capitalista, foram geradas diferentes abordagens acerca do assunto, nas quais são usadas diferentes nomenclaturas para a denominação de um aglomerado produtivo, sendo as principais delas: “Clusters”, Complexos Produtivos e Distritos Industriais (ROSENDO, 2004).
2.1. A abordagem de Michael Porter
Para esta resenha, será usada a nomenclatura de Porter (1989), autor que utiliza a terminologia de “clusters” para a denominação de arranjos produtivos. A sua pesquisa é feita por meio de um estudo de quatro anos de dez países industrializados e desenvolvidos, sendo eles: Dinamarca, Alemanha, Itália, Japão, Coréia do Sul, Cingapura, Suécia, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos.
Porter (1989) afirma que “cluster” é um agrupamento geográfico onde empresas correlatas numa determinada área, vinculadas por elementos comuns e complementares, se situam. Os aglomerados podem ter diferentes tamanhos, e isso depende de sua profundidade e sofisticação, mas a maioria inclui empresas de produtos ou serviços finais, fornecedores de insumos especializados, componentes, equipamentos e serviços, instituições financeiras e empresas em setores correlatos, além disso, geralmente também incluem empresas e setores como: distribuidores ou clientes, fabricantes de produtos complementares, fornecedores de infraestrutura especializada, instituições governamentais (ou privadas) dedicadas ao treinamento especializado, educação, informação, pesquisa e suporte técnico (diz respeito a universidades, centros de altos estudos e prestadores de serviços), treinamento vocacional e agências de normatização (PORTER, 1989). Pode ser citado como exemplo de “cluster” o Vale do Silício, nos Estados Unidos.
A partir dessa linha de raciocínio, é possível observar a existência de “clusters” na República Popular da China (RPC) mesmo que o país tenha uma formação diferente dos países analisados.
3. A história econômica problemática da RPC
A RPC tem 23 Províncias, cinco Regiões Autônomas, quatro Municípios Centrais e duas Regiões Administrativas Especiais. É possível observar a localização de cada uma delas através da Figura 1.
A RPC foi fundada em 1949 por Mao Tsé-Tung, líder do Partido Comunista Chinês (PCC). Em seu comando, o país tinha uma economia firmada através da agricultura e com uma base pré-industrial (DUTTA, 2005). As políticas econômicas da época procuravam uma desconcentração econômica, onde os investimentos não eram mantidos somente nas áreas costeiras (de relevância internacional), mas iam para o interior do país, com objetivo de não ter, ou reduzir ao máximo, uma concentração industrial. Esse governo perdurou até 1976, finalizando-se com a morte de Mao.
Depois disso, Deng Xiaoping assumiu o poder com uma política totalmente oposta à Mao, quando começou seu mandato abrindo as fronteiras econômicas. A sua política era de concentração econômica, onde os maiores investimentos eram feitos nas regiões costeiras, que tinham proximidade com portos ou uma infraestrutura suficiente para apoio ao comércio internacional. A opção foi um crescimento desigual, com uma região costeira responsável pela industrialização, puxada pelo mercado externo e investimento direto estrangeiro (RUIZ, 2006). Através dessas políticas que se é obtido uma especialização regional, dando origem, consequentemente, aos “clusters” da área costeira, como observado na Figura 2.
Durante a implementação das políticas de desenvolvimento de Xiaoping, as províncias costeiras e cidades portuárias foram favorecidas, onde foi usada uma medida governamental denominada “estratégia de desenvolvimento costeiro”, que tinha como característica a redução dos custos fiscais e a criação de ambientes de negócios similares aos ocidentais e costeiros (RUIZ, 2006). O resultado dessa estratégia pode ser observado quando se é analisado o investimento estrangeiro na RPC, onde os maiores investimentos são feitos em regiões costeiras.
Com as políticas econômicas exercidas por Xiaoping, a RPC teve um desenvolvimento específico e não igualitário, onde mesmo que as regiões costeiras deem o retorno financeiro necessário para o desenvolvimento do país, este não é alocado de forma com que o país inteiro goze dos recursos, ou seja, apenas algumas seletas regiões tem o desenvolvimento suficiente, enquanto as outras regiões sofrem com a falta de investimento, o que prejudica não só os capitalistas daquelas áreas, mas principalmente o proletariado, que tem a sua qualidade de vida afetada.
A parte interior da RPC é, em sua maioria, dominada pelas indústrias do setor primário (agricultura, silvicultura, pecuária e pesca) e secundário (indústrias de mineração, manufatura, fornecimento de eletricidade, água e gás, e indústria de construção). Dessa forma, é possível observar a decaída desses setores com a entrada de Xiaoping no poder quando se é comparado a participação desses setores no PIB do país.
Depois da morte de Xiaoping, em 1997, foi iniciado um projeto para o desenvolvimento mais igualitário e redução da desigualdade regional. Em 1999, foi feito o plano “Desenvolvimento do Oeste” com objetivo de mudar as antigas políticas econômicas. Foram colhidos frutos positivos dessas mudanças das medidas, onde a diferença entre a média do PIB das cidades da costa e do interior diminuiu.
Mas mesmo com a evolução da RPC nesses aspectos, o país ainda sofre com o subdesenvolvimento, não em um todo, mas com grupos específicos, que continuam sendo os proletários que moram nas regiões com menor desenvolvimento. Como consequência, tem-se salários menores, menos benefícios, oportunidades e qualidade de vida.
Isso pode ser percebido na comparação do PIB do país com o seu PIB per capita, o qual existe um grande desequilíbrio entre eles. O PIB chinês era, em 2021, avaliado em 17.73 trilhões de dólares e o seu PIB per capita era, em 2021, avaliado em 12.556,3 dólares pelo World Bank.
A discrepância dos dados pode ser melhor analisada quando se é comparado com países desenvolvidos já anteriormente estudados por Michael Porter. Dentre eles, a RPC só tem o PIB menor do que os Estados Unidos (23 trilhões de dólares em 2021), que é a maior potência econômica do mundo, contudo, quando é analisado o PIB per capita temos que a RPC perde para todos, e com grande diferença, onde o menor entre os 10 países é a Coréia, com 34.757,7 dólares em 2021. Além disso, a RPC tem um PIB que chega a superar o da União Europeia inteira (17.088 trilhões de dólares), mas em contrapartida, também mantém a discrepância quando se é comparado com o PIB per capita, equivalente a 38.234,1 dólares em 2021, conforme o World Bank.
Rafael Voigtel
Referências
BRINEY, Amanda. Discover the 23 Provinces of China, 2019. Disponível em: https://www.thoughtco.com/china-provinces-4158617. Acesso em: 24 jul. 2022.
CONSELHO DE ESTADO DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA. Constitution of the People’s Republic of China, 2019. Disponível em: http://english.www.gov.cn/. Acesso em: 24 jul. 2022.
CUNHA, Idaulo José. China: o passado e o presente de um gigante. Florianópolis, Visual Books, 2008.
DA NÓBREGA, Bruna Medeiros. Um estudo para a identificação de fatores que caracterizam o desenvolvimento industrial da China. 2020. 102 f. Trabalho de conclusão de curso (Graduação) — Curso de Engenharia da Produção, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2020.
Démurger, S; Sachs, J.D; Woo, W; Bao, S; Chang, G; Mellinger, A. Geography, Economic Policy, and Regional Development in China. National Bureau of Economic Research. Washington, 2002.
DUTTA, M. China’s industrial revolution: Challenges for a macroeconomic agenda. Journal of Asian Economics, v. 15, n. 6, p. 1169–1202, 2005.
Hsiao, C; Gastanaga, V. Factors Affecting Foreign Direct Investment with an Analysis of the Disparity between the Coastal and Western Regions of China. Review of Pacific Basin Financial Markets and Policies, v. 4, n. 4, p. 479–493, 2001.
PORTER, M. E. A Vantagem Competitiva das Nações. Rio de Janeiro, 1989.
ROSENDO, Roberto Cezar. A indústria petrolífera em Macaé: caracterização e potencialidades do sistema produtivo local. 2004. 299 f. Tese (Doutorado em Ciências de Engenharia — área produção) — Laboratório de Engenharia de Produção, Universidade Estadual do Norte Fluminense, Campos dos Goytacazes, 2004.
RUIZ, Ricardo Machado. Polarizações e desigualdades: desenvolvimento regional na China (1949–2000). Universidade Federal de Minas Gerais, Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional. dez. 2006. The World Bank: Data.
The World Bank. 2022. Disponível em: https://data.worldbank.org/indicator/ny.gdp.mktp.cd/. Acesso em: 25 jul. 2022
O FalaPet é uma publicação de resenhas do PET Economia da UFF Campos.
As opiniões emitidas nesta publicação são de inteira e exclusiva responsabilidade do autor, não expressando, necessariamente, o ponto de vista do grupo PET Economia/UFF Campos sobre os temas tratados.